Resolvi aproveitar o clima do confesse que está rolando por causa de Game of Thrones para publicar esse texto que está há meses na minha gaveta… Isso poderia ter sido um desabafo, uma confissão cara a cara, mas optei que não fosse, pois se confessar nem sempre vale a pena.

Conheço uma mulher há tantos anos que meu primeiro instinto é chamá-la de menina. Bom, ela já fez 20 e muitos anos e nós comemoraríamos duas décadas de amizade… Se ainda fossemos amigas. Decidi não transformar meus incômodos e mágoas com ela numa DR, muito menos numa tentativa de consertar as coisas entre nós. É de se esperar que em tanto tempo nós tenhamos tido os nossos atritos e breves períodos brigadas uma com a outra. Não era uma amizade perfeita e nem teria como ser, uma vez que nós não o somos.

Passamos por muitas coisas juntas e no ano passado houve um incidente que invocou o basta dentro de mim. Depois de certa experiência com as pessoas você se torna mais prático na vida, e passa a decidir por quais lutas vale a pena brigar, e por essa não valia. Em nossos raros contatos, antes do momento basta, voltávamos àquela velha máxima de “vamos marcar”, e nunca de fato marcávamos. Eu tentava, mas aos poucos fui notando que essa manifestação da parte dela era totalmente vazia. Também fui chegando à conclusão que eu não sabia nada sobre a vida daquela grande amiga de longa data, mas que sempre que nos falávamos eu contava tudo o que havia acontecido na minha.

***

Outro dia vi a história de David que, ao começar a amadurecer deixou de lado seu melhor amigo de infância, Scott. O primeiro já pensava em namoro, enquanto o segundo ainda se agarrava aos velhos hábitos de infância. Havia uma crescente diferença de interesses entre os dois, e nenhum adolescente conseguiria lidar com essa situação com sabedoria emocional. David então acabou se afastando de Scott por achar que seu comportamento atrapalhava sua imagem perante os colegas.

E o que aconteceu no decorrer da narrativa surpreendeu a todos… Scott estava fazendo aniversário e não abriu mão da presença de seu melhor amigo durante a comemoração. Forçado a ir pelos pais, que nunca tem noção do quanto seus filhos são capazes de mudar do dia para a noite, David compareceu. E, durante a festa, Scott sofre um acidente e morre. David, que estava odiando cada segundo presencia o acidente e embarca num espiral de culpa por ter sido negligente com aquele que havia sido seu primeiro e único amigo de longa data.

No dia seguinte, na escola, embora 97% dos alunos do colégio sequer soubesse quem Scott era, tomar consciência de que alguém que caminhava naqueles mesmos corredores ontem, está morto agora, abala a ideia que os jovens costumam ter de que esse tipo de coisa nunca vai acontecer com eles ou com alguém próximo. Logo começam a inquerir David sobre Scott, seus hábitos e gostos, e isso o tira do sério. O adolescente explode diante de todos.

Ele admite que vinha sendo um péssimo amigo para Scott, mas acusa todos ao seu redor de também estarem sendo. Ressalta que embora estivesse tratando Scott mal, essas pessoas que agora parecem super interessadas nele também o tratavam mal o tempo todo. Que não faz diferença nenhuma que queiram conhecer Scott, agora que ele está morto, através de suas memórias, e que ao invés disso deveriam demonstrar um mínimo de interesse, cuidado e carinho por aqueles que chamam de amigos e ainda estão vivos.

***

Eu demorei a perceber que eu era amiga daquela mulher, mas que, por diversos fatores ela não era minha amiga. O caso é que existem conflitos e diferenças pessoais que podemos superar, e outras ocorrências que às vezes sequer podem receber essas denominações pois não passam de acontecimentos naturais da vida, mas que nos levam por caminhos opostos, e que podem terminar de descascar aquele pneu careca em que uma relação havia se tornado e determinar a estrada que uma amizade irá tomar.

O foco aqui não é falar sobre o que aconteceu comigo, nem com o David e o Scott, mas usar esses cases como exemplo para que talvez você possa refletir e reconhecer algo de errado nas suas relações. Para que haja tempo de evitar o afundamento do barco, caso se julgue possível e seja da vontade de ambos. E não só isso, o tópico é também explicar que eu escolhi o naufrágio dessa amizade, pois acredito que não devemos lutar por certas coisas. As relações – e isso é uma verdade universal – são uma via de mão dupla.

Na medida do possível, tente não cobrar e não exigir nada de ninguém. Na verdade, quanto menos você precisar emocionalmente dos outros, melhor para você, mas caso tenha certas dependências emocionais, entenda, se o carinho ou a amizade não vierem naturalmente é porque o outro não quer, não acha importante, não tem interesse. Não se diminua e não mendigue atenção como o Scott fez para se agarrar ao David, não ignore o que te incomoda e empurre mágoas com a barriga como eu fiz para evitar conflitos.

Se você acha que a sua relação com alguém é frágil e não vai resistir a mais uma ou duas pancadas, ou simplesmente, não vale a pena se indispor desse jeito por motivo nenhum, é provável que nem exista mais uma relação para ser salva, apenas a lembrança do que um dia ela foi. Você não precisa entrar num pé de guerra e terminar algo de forma desagradável só para reforçar o status que de certa forma já era vigente. Pior que perder um amigo é querer forçar alguém a querer continuar a ser seu amigo… Não confesse. Deixe estar… E de vez em quando, ria das boas lembranças que você vai inevitavelmente guardar.

segundasdeprimeira post1

Deixe um comentário