Obrigada

Eu fiquei com a melhor parte.

Não que importe para você, mas importa para mim.

Talvez você nem pense mais nisso, em mim e tudo que passamos no tempo que tivemos, ou talvez ainda sinta o tormento que senti por muitos anos depois que tudo teve um fim. Eu lembro que fui eu que defini esse fim, mas o fiz por necessidade. Sabe, quando você passa a permitir que alguém te magoe quase diariamente, só por amor, afeição e apego é sinal de que você talvez precise de ajuda.

Eu precisava.

Enxerguei essa necessidade, minha fraqueza, meus erros e ao que eu vinha me submetendo a viver por querer te manter perto de mim. Diagnostiquei minha doença e ela tinha nome próprio, o seu. E depois disso, ainda tardei a aceitar que a única cura era a distância.

Desde que nos apartamos sonhei contigo incontáveis noites. Os sonhos nunca eram bons, e eu não gostava da sua imagem de forma recorrente no meu subconsciente. Há quem diga que quando isso acontece é porque o outro ainda pensa em você, está falando de você. Eu não sei, talvez você ainda se junte com uma ou duas pessoas para falar mal de mim, pois tenho certeza que já se entreteu algumas horas com isso, como eu me entreti também. Não sou hipócrita a ponto de negar que relembrar seus pontos negativos e suas atitudes idiotas foram excelentes aceleradores para queimar o resto de afeição que eu sentia por você. E eu abusei desse método nessa e em outras situações.

Por mais preciosa que uma relação seja, que a nossa fosse (como eu a via e sentia), por mais falta que eu tenha sentido de você quando nos afastamos, senti também um alívio que não consigo explicar. Te dizer tudo que me estava entalado foi definitivamente como tirar um boi das costas. E depois de feito, eu sequer chorei… Me senti liberta.

Foi uma pena você não ter recebido bem, por mais que eu tenha me empenhado em nos findar de forma educada e respeitosa. Acho que sua reação diz bastante sobre quem você é, o caráter que tem, e quanto difere de quem eu sou. Acho que serviu para deixar mais claro que eventualmente aquele seria o nosso destino.

É incrível como pequenas coisas da vida acabam nos fazendo trombar com uma referência que nos leva a pensar diretamente em alguém que queremos esquecer. E foi assim que me peguei pensando em você hoje, depois de tanto tempo sem lembrar que habitávamos a mesma terra. Foi o que me motivou a escrever isso tudo aqui…

Em meus devaneios, percebi que fiquei com a melhor parte do desfeito.

Sim, perdi alguém com quem eu contava para tudo, tive minha confiança traída, nunca mais me permiti ter nada sequer parecido com outra pessoa, mas, mesmo sem me esforçar para isso, ganhei a melhor fatia do bolo.

Não vou fingir que não existe uma disputa camuflada quanto a quem se deu melhor na vida depois do fim, existe sim, e hoje eu sinto que tenho motivos para acreditar que me dei bem. Pelo pouco que ouvi de quem você se tornou, por conhecidos que ainda não entenderam que de você não quero ouvir nem o nome, nada pareceu ter mudado.

Suas noções parecem as mesmas. As mesmas limitações autoimpostas, a mesma falta de personalidade, a mesma carência exacerbada, ainda colocando a responsabilidade da sua felicidade em cima dos outros… Considero isso uma queda alta e brutal. Pior que não melhorar, é continuar o mesmo quando não se é uma pessoa boa.

Se ainda penso em você? Às vezes…

Se sinto sua falta? Não.

Sinto falta do que eu achei que tivéssemos, e claramente não tínhamos. Sinto falta de experimentar o gosto da idealização, algo que perdi quando te deixei de lado. Você tirou um pedaço muito grande de mim. Idealizar soa parecido demais com autoenganação, e isso eu nunca mais vou me permitir, mas utilizar esse recurso era um truque que ajudava a adoçar a vida em momentos não tão fortuitos.

Depois de você abandonei o açúcar. Hoje uso adoçante. Todo mundo sabe que não é a mesma coisa, mas faz menos mal à saúde. Física e mental… No processo, perdi peso, ganhei confiança, aprendi a dizer não, aprendi a impor limites, aprendi a não aceitar menos do que dou, menos do que sou. Aprendi o que é prioridade, e não tem nada mais gostoso que isso, nem chocolate.

Gordofobia Rio 2016

Noite preguiçosa de sexta, assistindo a apresentação das atletas do arremesso de peso feminino na #ESPN… Todas gordas, mas e daí? Não é novidade nenhuma que pessoas sobrepeso e obesas são tão capazes de agilidade, força e coordenação motora quanto uma pessoa considerada magra ou de tamanho padrão. E então veio o comentário que eu não esperava:

“Apesar do tamanho das moças aí, essa é uma prova de velocidade.”

Ta aí uma frase que eu não pensei ouvir, ao vivo, em plena Olimpíadas. Prontamente comentei com amigos que também estavam assistindo à transmissão para constatar que eu não havia ouvido errado, e eu tinha escutado bem demais. Naturalmente não pude manter o planejamento do texto que seria publicado aqui hoje. Então vamos falar (de forma breve) sobre gordofobia e sua versão mais desprezível, a gordofobia disfarçada.

Por mais que não tenha sido usado nenhum termo pejorativo, a forma como a frase foi falada, com a entonação e o contexto em que está inserida, ela acaba por se tornar, sim, um insulto. Ela delimita uma clara linha de capacidade – ou da falta dela, a partir da forma física das pessoas, não apenas das atletas em questão, mas de todas as pessoas que compartilham aquela condição. Interessante que, ao assistir o rugby também vemos atletas gordos, mas não lembro de nada ter sido dito a respeito de sua forma física. Talvez eu tenha perdido algum jogo, ou talvez fosse outro comentarista.

Isso nos faz pensar no quanto esse tema ainda é ignorado e encarado como piada hoje em dia. Tem sempre alguém pra dizer que quem reclama de gordofobia, machismo e homofobia está se vitimizando, ~cagando regras~ ou ~problematizando~ (como virou moda rotular), sobre questões que não passam de brincadeiras, parte da cultura ou da religião, respectivamente. Para essas pessoas, bullying não existe, a gente leva tudo a ferro e fogo, não temos senso de humor… Bom, em certos assuntos não cabe mesmo nenhum senso de humor.

Certamente esse jornalista, se é que se trata de um, não será repreendido por seu “lapso”. Por explanar de forma tão ~inocente~ sua opinião, pura gordofobia disfarçada, sobre um assunto que atinge mais de 50% da população brasileira, mais de 2,1 bilhões de pessoas sobrepeso e obesas ao redor do mundo, e principalmente, as mulheres que estavam sendo expostas naquele campo, acenando para o público, após anos de treinamento para se tornarem boas o suficiente ao ponto defenderem seus países numa competição mundial.

É ultrajante que esse tipo de coisa aconteça, e mais ultrajante ainda que seja tolerada. Você não precisa gostar de gordos nem querer ser um, você precisa apenas não desrespeitá-los, não desmerecê-los, e não julgá-los por sua forma. Qualquer incapacidade de viver dessa forma acaba por dizer muito sobre o tamanho e o peso do seu caráter.

Cidadania: Um Exercício Diário

Como não sou uma pessoa mal educada, frequentemente esqueço que elas existem. Como humana e civilizada, eu aprendi desde muito nova  minha responsabilidade como pedestre. Respeitar o sinal, atravessar na faixa, olhar para os lados, enfim, o básico… O que não quer dizer que eu sempre respeite essas regras, mas que tenho consciência, quando as infrinjo, que se algo acontecer comigo, a culpa provavelmente será minha.

Frequentemente ocorrem acidentes entre pedestres, ciclistas, motoqueiros e carros de passeio, ônibus ou caminhões. Quando acontece algo desse tipo eu automaticamente acarreto a culpa ao maior “agressor”, que, nesse caso, é o veículo de grande porte. Só não condeno o motorista quando a apuração do caso prova que ele não teve culpa… O interessante é que quase sempre essas histórias somem da mídia antes de responderem quem atravessou o caminho de quem. E no noticiamento do fato recente, o motorista acaba ficando estigmatizado pela fatalidade.

Por esses dias, eu e minha mãe atravessávamos na faixa com o sinal aberto para os pedestres. Íamos do lado que havia ciclovia, para o lado da faixa dos ônibus. Eu cheguei a calçada primeiro e ela logo atrás de mim. O que eu não percebi (e não esperava) era um ciclista que vinha se espremendo, em movimento e alta velocidade, entre o meio fio e os carros parados no sinal. Não satisfeito em estar do lado oposto à ciclovia e em quase atropelar minha mãe, ele ainda berrou no ouvido dela ao passar para que ela saísse do caminho.

Ela acabou respondendo e ele não gostou do fato dela ter reagido a seu atrevimento. Então, deu meia volta com a bicicleta e resolveu comprar briga… A rua toda parou para olhar, mas naturalmente ninguém fez nada, afinal, estamos no Brasil. Talvez, mais dia, menos dia, esse indivíduo acabe atropelado por aí, possivelmente por culpa dele mesmo, e é provável que essa se torne mais uma situação em que o motorista acaba, aos olhos do público, como o culpado.

Como jornalista, sou compelida a buscar a verdade, os dois lados da história, antes de ir acender uma vela no local do ocorrido pela alma do pobre vitimado. Mas como humana, sou automaticamente levada a acreditar que o galho quebrado é o que foi prejudicado, e nem sempre é esse o caso. Estou falando sobre mim, mas sei que muitos por aí acabam fazendo o mesmo.

Precisamos perder esse hábito e nos reeducarmos não só como pedestres, ciclistas e motoristas, mas principalmente, como cidadãos. Precisamos entender a nossa responsabilidade diante de todas as situações, do mundo, das nossas vidas e da vida daqueles que nos cercam. Só assim poderemos começar a construir uma nação. Por enquanto, somos só um bando de gente existindo no mesmo pedaço de chão…

Reflesexta I: Atenção Virtual do Amigo Real.

Como adoramos inventar palavras, aí vem mais uma para o nosso dicionário particular: Reflesexta trarão pequenas (ou nem tanto) reflexões sobre a vida. Serão as nossas historinhas de fim de semana, sempre publicadas às sextas, para você matutar um pouquinho aí durante a folga… Então vamos ao primeiro tema da série:

***

Os conceitos de amizade, carinho e consideração hoje em dia são bem deturpados, não é?

Se você considera alguém seu amigo, e acredita que essa pessoa também te considera um amigo; Se você apoia os projetos, curte, compartilha, mostra para outras pessoas, e depois descobre que seu ~amigo~ não tira 5 segundos para fazer o mesmo por você, ou sequer para te seguir de volta numa rede social ou comentar as publicações dos seus projetos pessoais, a amizade, o carinho e a consideração que você sente por ele acabam sendo afetados negativamente.

Por mais que pareça estúpido, rola uma mágoa genuína. As redes sociais definitivamente vieram para mudar a forma com que interagimos, agimos e reagimos às coisas. Isso tem seu lado negativo, e tem também o seu lado positivo. E nesse caso específico, talvez até um unfollow rancoroso ocorra, tipo: “se você não me segue/apoia, não serei eu que vou ficar aqui dando ibope para o que você faz.” Fizemos tanta piada com o papel de trouxa que esquecemos que ele realmente existe e muitas vezes nós nem percebemos que estamos fazendo.

E quando você vê que além de não haver reciprocidade no apoio, esse ~amigo~ apoia/da ibope para artistas que estão longe de sua realidade, famosos que já estão consagrados e não precisam daquele like ou daquele compartilhamento que ele da com tanto bom gosto, a situação fica ainda mais chata. Claro que ele não deve deixar de seguir e apoiar quem ele gosta, mas custa tanto assim fazer o mesmo por você?

Pior que isso é descobrir que seu bff está curtindo projetos de pessoas que ele sabe, foram sacanas com você, mas não está nem aí para o seu. O sentimento que desperta não se restringe mais ao online, e isso afeta de verdade a sua relação com a pessoa. Sim sim, parece idiota, mas o apoio ou a falta dele deixam claro o desinteresse do outro, e tomar consciência do desinteresse de alguém que você estima, e alguém que diz se preocupar e te amar, mesmo que seja aparentemente apenas um desligamento virtual, pode ser fatal até para as amizades mais antigas.

E por que, se parece ser um motivo bobo para deixar afetar seu relacionamento, isso ainda importa? Porque a reflexão dessa falta de apoio toca no que é real dentro de você e em tudo que vocês compartilham como amigos.

O conselho da sexta feira é: preste sempre atenção nos seus amigos-de-fé-irmãos-camarada, eles podem ter abandonado esse posto na sua vida, enquanto você continua perpetuando rituais de parceria unilaterais. E para vocês que são amigos de alguém, deem atenção ao que eles produzem. Com certeza o seu carinho vai render mais frutos quando direcionado ao seu amigo, do que àquela banda ou àquela pessoa distante, que nem faz parte da sua vida, mas para qual você dedicou 5 ou mais segundos de atenção, enquanto negligenciava quem tem te apoiado.

Bom fim de semana, Leigores ☕️

Nem Sempre Confesse

Nem Sempre Confesse

Resolvi aproveitar o clima do confesse que está rolando por causa de Game of Thrones para publicar esse texto que está há meses na minha gaveta… Isso poderia ter sido um desabafo, uma confissão cara a cara, mas optei que não fosse, pois se confessar nem sempre vale a pena.

Conheço uma mulher há tantos anos que meu primeiro instinto é chamá-la de menina. Bom, ela já fez 20 e muitos anos e nós comemoraríamos duas décadas de amizade… Se ainda fossemos amigas. Decidi não transformar meus incômodos e mágoas com ela numa DR, muito menos numa tentativa de consertar as coisas entre nós. É de se esperar que em tanto tempo nós tenhamos tido os nossos atritos e breves períodos brigadas uma com a outra. Não era uma amizade perfeita e nem teria como ser, uma vez que nós não o somos.

Passamos por muitas coisas juntas e no ano passado houve um incidente que invocou o basta dentro de mim. Depois de certa experiência com as pessoas você se torna mais prático na vida, e passa a decidir por quais lutas vale a pena brigar, e por essa não valia. Em nossos raros contatos, antes do momento basta, voltávamos àquela velha máxima de “vamos marcar”, e nunca de fato marcávamos. Eu tentava, mas aos poucos fui notando que essa manifestação da parte dela era totalmente vazia. Também fui chegando à conclusão que eu não sabia nada sobre a vida daquela grande amiga de longa data, mas que sempre que nos falávamos eu contava tudo o que havia acontecido na minha.

***

Outro dia vi a história de David que, ao começar a amadurecer deixou de lado seu melhor amigo de infância, Scott. O primeiro já pensava em namoro, enquanto o segundo ainda se agarrava aos velhos hábitos de infância. Havia uma crescente diferença de interesses entre os dois, e nenhum adolescente conseguiria lidar com essa situação com sabedoria emocional. David então acabou se afastando de Scott por achar que seu comportamento atrapalhava sua imagem perante os colegas.

E o que aconteceu no decorrer da narrativa surpreendeu a todos… Scott estava fazendo aniversário e não abriu mão da presença de seu melhor amigo durante a comemoração. Forçado a ir pelos pais, que nunca tem noção do quanto seus filhos são capazes de mudar do dia para a noite, David compareceu. E, durante a festa, Scott sofre um acidente e morre. David, que estava odiando cada segundo presencia o acidente e embarca num espiral de culpa por ter sido negligente com aquele que havia sido seu primeiro e único amigo de longa data.

No dia seguinte, na escola, embora 97% dos alunos do colégio sequer soubesse quem Scott era, tomar consciência de que alguém que caminhava naqueles mesmos corredores ontem, está morto agora, abala a ideia que os jovens costumam ter de que esse tipo de coisa nunca vai acontecer com eles ou com alguém próximo. Logo começam a inquerir David sobre Scott, seus hábitos e gostos, e isso o tira do sério. O adolescente explode diante de todos.

Ele admite que vinha sendo um péssimo amigo para Scott, mas acusa todos ao seu redor de também estarem sendo. Ressalta que embora estivesse tratando Scott mal, essas pessoas que agora parecem super interessadas nele também o tratavam mal o tempo todo. Que não faz diferença nenhuma que queiram conhecer Scott, agora que ele está morto, através de suas memórias, e que ao invés disso deveriam demonstrar um mínimo de interesse, cuidado e carinho por aqueles que chamam de amigos e ainda estão vivos.

***

Eu demorei a perceber que eu era amiga daquela mulher, mas que, por diversos fatores ela não era minha amiga. O caso é que existem conflitos e diferenças pessoais que podemos superar, e outras ocorrências que às vezes sequer podem receber essas denominações pois não passam de acontecimentos naturais da vida, mas que nos levam por caminhos opostos, e que podem terminar de descascar aquele pneu careca em que uma relação havia se tornado e determinar a estrada que uma amizade irá tomar.

O foco aqui não é falar sobre o que aconteceu comigo, nem com o David e o Scott, mas usar esses cases como exemplo para que talvez você possa refletir e reconhecer algo de errado nas suas relações. Para que haja tempo de evitar o afundamento do barco, caso se julgue possível e seja da vontade de ambos. E não só isso, o tópico é também explicar que eu escolhi o naufrágio dessa amizade, pois acredito que não devemos lutar por certas coisas. As relações – e isso é uma verdade universal – são uma via de mão dupla.

Na medida do possível, tente não cobrar e não exigir nada de ninguém. Na verdade, quanto menos você precisar emocionalmente dos outros, melhor para você, mas caso tenha certas dependências emocionais, entenda, se o carinho ou a amizade não vierem naturalmente é porque o outro não quer, não acha importante, não tem interesse. Não se diminua e não mendigue atenção como o Scott fez para se agarrar ao David, não ignore o que te incomoda e empurre mágoas com a barriga como eu fiz para evitar conflitos.

Se você acha que a sua relação com alguém é frágil e não vai resistir a mais uma ou duas pancadas, ou simplesmente, não vale a pena se indispor desse jeito por motivo nenhum, é provável que nem exista mais uma relação para ser salva, apenas a lembrança do que um dia ela foi. Você não precisa entrar num pé de guerra e terminar algo de forma desagradável só para reforçar o status que de certa forma já era vigente. Pior que perder um amigo é querer forçar alguém a querer continuar a ser seu amigo… Não confesse. Deixe estar… E de vez em quando, ria das boas lembranças que você vai inevitavelmente guardar.

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A Carência da Moda Nacional

A Carência da Moda Nacional

Essa semana fui levada a refletir sobre a indústria de moda nacional, mas não de forma geral, o foco do pensamento foi voltado ao nicho Mignon e Plus Size com relação a variedade, preço e qualidade. Enquanto sua reação com o mundo da moda talvez possa ser expressada com satisfação pelas tendências que surgem, as que ressurgem, e surpresa pelas que sobrevivem por temporadas e mais temporadas sem perderem o apelo social, para mim, o buraco no que diz respeito a inclusão e representatividade é bem mais embaixo… É sério que já estamos em 2016 e tudo continua quase igual a 10, 15, 20 anos atrás para quem é pequeno ou magro demais, para quem é sobrepeso, para quem é alto, e para quem calça menos que 36 ou mais que 39? Brasil, queira melhorar…

De roupas à calçados, há uma carência sem precedentes no mundo fashion para pessoas que não se enquadram nos tamanhos considerados padrão. Para as mais magras e/ou baixinhas, conhecidas também como Mignon, ter que comprar roupas na seção infantil não é uma novidade, muitas só encontram opções ali. Para as mais gordinhas e/ou altas, não encontrar uma roupa que lhes sirva ou que não pareça ter sido feita com panos de chão melhorou um pouco nos últimos anos, mas ainda está longe de alcançar o resultado ideal. Mas especialmente, para quem calça menos que 36 e mais que 39 a vida pode se tornar consideravelmente mais amarga.

O interessante é que todos precisamos do algo para vestir e calçar. Cada situação social exige um decoro, não só no que diz respeito a comportamento, mas também a um tipo de código de vestimenta do que se adequaria a determinada ocasião. Além de enfrentar as dificuldades já citadas em encontrar algo que sirva, os poucos produtos que atendem a necessidade dessa parcela de pessoas excluídas das araras são extraordinariamente mais caros do que aqueles que se encontra de sobra no mercado. Quando não, o que reina é o acabamento porco e má qualidade dos materiais, resultando em mercadorias que podem ser consideradas descartáveis. Depois de usar poucas vezes, já não presta mais…

Usemos como exemplo uma mulher plus size… Além do sobrepeso, o que já dificulta bastante a satisfação do guarda roupas, a biologia de seu corpo resolveu que ela teria um pé tamanho 42… Em que loja de calçados ela pode encontrar sapatos que lhe sirvam? Numa busca rápida na internet encontrei 5 sites nacionais que comercializam sapatos com “numeração especial”, como são chamados. E essa é a opção desta mulher; Ter que escolher entre modelos limitados, comprar pela internet sem a certeza de que o sapato tem qualidade ou se irá calçar bem, lidar com a possibilidade de precisar trocar a mercadoria, lidar com as burocracias dos Correios (outro serviço porco do país) para essa troca, e claro, pagar uma fortuna por isso. Enquanto uma sapatilha de “numeração padrão” pode ser encontrada por R$50 em qualquer loja física perto da sua casa, uma com “numeração especial” começa a ser vendida à partir de R$90 na loja online mais barata.

Talvez você esteja pensando que são casos isolados, ou que não constituem uma quantidade significativa de pessoas a ponto de merecerem atenção da indústria, mas não é bem assim. Existe uma grande parcela da comunidade feminina cujo pé não parou de crescer quando chegou ao 39. Eu mesma, no meu limitado grupo de amigos conheço umas dez mulheres entre 18 e 60 anos que vem lidando com esse problema a vida inteira. O mesmo vale para quem calça menos de 36, as Plus Size e as Mignon, todas gostam de coisas bonitas a preços acessíveis e com qualidade, e nenhuma delas tem o privilégio de encontrar seu número de roupa ou sapato em qualquer loja de esquina.

O resultado da falta de opções no mercado mexe não apenas com o bolso, mas principalmente com o emocional. Com o desgosto constante de passar por uma vitrine, amar alguma coisa, e saber que ela não te serve, pois quem a desenhou e produziu não o fez para a massa, fez para um público com padrão limitado e que não corresponde nem de longe ao que constitui uma sociedade. Designers e estilistas, busquem sair um pouco do mundo no qual vocês escolheram viver e olhem para o mundo no qual todos vivem. Talvez esse relance os faça perceber a diversidade de gostos e tipos que vem sendo negligenciados por décadas.

É movida por um desejo profundo de fazer alguma diferença e estimular a melhora desse mercado que escrevi esse texto. A sociedade do consumo abraça também os grupos menos representados. As novas gerações vem com ainda mais diversidade pessoal, e com ainda mais desejo por coisas bonitas, novas, e as querem em quantidade. O consumismo massivo de bens e serviços disponíveis está sendo alimentado graças a toda essa tecnologia, a conexão constante com as marcas através das redes sociais, a variedade e a elevada produção dos mesmos. Para quem quer crescer nesse negócio, a prioridade deveria ser atrair novos públicos e saciá-los oferecendo aquilo que necessitam. Dar voz aos ignorados e atender a lei da Oferta e Procura desses nichos pode ser mais uma porta para o sucesso, e para isso, basta que ela seja aberta…

Ninguém faz melhor propaganda de uma marca ou produto do que aqueles que o consomem.

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Quem tem Tinder, tem medo.

Quem tem Tinder, tem medo.

Pergunte a qualquer um que tenha uma conta no aplicativo: é comum sentir receio ao criar um perfil com a sua foto, muitas vezes linkado ao Facebook, e não imaginar quem vai passar pela sua página nesse cardápio humano; Uma pessoa com a qual você cortou relações, um(a) ex qualquer coisa, amigos do(a) ex qualquer coisa, uma pessoa para a qual você se declarou morta, mas que você sabe que te stalkeia, e incontáveis outras desequilibradas e com caráter duvidoso. Dependendo também de como a sua mente funciona, fica impossível não começar a imaginar alguém que você detesta dando match em outro alguém que te fez muito mal, e prontamente visualizar a cena dessas duas pessoas terríveis sendo felizes juntas…

Poucas coisas no mundo são tão ruins quanto ver gente que não presta se refastelando na vida, e uma delas pode ser a experiência de tentar formar um vínculo com alguém 100% estranho estando atrás de um aparelho eletrônico. Sou muito liberal com algumas coisas, mas o Tinder traz a tona o conservadorismo que há em mim. Constatei que não gosto da dinâmica do serviço e do comportamento geral por lá. O aplicativo fornece seu nome e idade, local de trabalho e estudo, espaço para 6 ou 7 fotos e 500 caracteres caso você deseje colocar alguma descrição. São inúmeras as formas para julgar alguém num ambiente desses. Embora o que esteja exposto para primeiro impacto seja bastante restrito, tais informações acabam sendo marcantes pra alguém que, como eu, usa repelente a base de ceticismo quando tem que lidar com o desconhecido.

Depois de determinada idade, que varia de pessoa para pessoa, ficamos cheios de manias… Não da mais para aturar certas coisas, nem se misturar com todo tipo de gente. Passamos a utilizar filtros cuja exigência cresce de acordo com nosso amadurecimento, objetivos, decepções e gostos pessoais. Não é mais tão simples querer fazer parte da vida de alguém e deixar que esse alguém faça parte da sua também. Existem requisitos a serem preenchidos… A primeira impressão sempre vem pela foto de capa. Ali já da para saber se vale a pena ou não abrir o perfil para ver um pouco mais. Passo direto por gente na praia, cachoeira, no futebol, fazendo trilha, esportes radicais e naquelas muvucas sociais. Não tenho nada em comum com alguém que tem essas atividades como prazeres primários…

Passada essa fase da triagem, chegamos ao “sobre”, e aí o que pode parecer puro preconceito reflete, na verdade, um senso de autopreservação muito grande. Se tem WhatsApp publicado e/ou está pedindo seguidores no Snapchat/Instagram? Passo. Expressa apoio/uso de drogas, dependência alcoólica e/ou fanatismos? Passo. Erros de português, concordância, falta de coerência e frases obsoletas tipo: Foco, força e fé – Deus no comando sempre – Vem que no caminho eu te explico? Passo! Eu me conheço bem, não quero contato com quem que se expõe tanto, com alguém que da tanto valor aos likes e follows da vida online, com vícios que desaprovo, com déficits difíceis para um jornalista engolir, e alguém incapaz de se expressar com as próprias palavras em menos de 500 caracteres.

Se uma amizade assim eventualmente surgir será naturalmente, por contato direto, nunca por uma busca online, e o que faz diferença nesse caso é justamente a questão de se tratar de uma busca. É muito diferente entrar na vida de alguém por ação do destino e procurar fazer parte da vida de alguém através de um meio digital. Na internet, a avaliação se torna mais criteriosa pois ela grita que, se tudo der errado para você, a culpa é sua. Se foi algo que você mesmo procurou, e além de procurar, permitiu, você só tem a si mesmo para responsabilizar por qualquer cilada na qual venha a se meter. É provável que você justifique seu sofrimento com a transgressão alheia e sinta pena de si mesmo por ter sido sacaneado, mas não é nada fácil admitir que talvez você esteja passando por algo desagradável por ter sido permissivo e inconsequente.

Para evitar tudo isso eu antecipo possibilidades, não faço nada tomando por garantia a certeza. Meses atrás uma amiga me convenceu a abrir uma conta no Tinder. Ela contava regularmente histórias divertidas com pessoas legais que encontrou através do app. Lá pelo vigésimo sétimo relato de pessoa incrível, resolvi arriscar. Essa experiência serviu mais como autoavaliação crítica e estudo antropológico, do que realmente uma forma de conhecer gente interessante, embora eu tenha conhecido uma ou duas. Me vi diante de desafios morais ao utilizar o aplicativo, especialmente quando meu superpoder de Overthink¹ entrava em ação. Se eu começasse a conversar com alguém que diz que não se diverte sem bebida, meu superpoder era acionado… Ele me colocava num Flashforward² e me fazia visualizar um futuro que ainda era apenas uma possibilidade.

Nesse futuro imaginário nós éramos amigos, e essa pessoa que não se divertia sem bebida há muito já se tornara um alcoólatra. Ao voltar para o presente, instantaneamente surgiam as perguntas: Vale a pena? Vale a pena abrir minha vida para essa pessoa, que já se mostra bastante problemática, me importar com ela, para mais tarde ter que lidar com isso? Vale a pena arriscar perder uma amizade caso a pessoa não admita que precisa se tratar? Vale arriscar me tornar vítima de qualquer insanidade temporária causada pela mistura perigosa do meu amigo? E após pensar em muitas mais perguntas como essas, o meu interesse pela pessoa e em ter qualquer tipo de envolvimento com ela caíam por terra.

Todos temos bagagem. Todos temos qualidades, defeitos e vícios; Fantasmas e coisas mal resolvidas, mas algumas são mais graves e pesadas que outras, e tem coisas com as quais não vale a pena lidar. É horrível pensar em deixar alguém de lado por sua bagagem, mas quando você admite que existe uma possibilidade de futuro, por menor que seja, você precisa considerar que, como amigo ou como algo mais, os problemas dela (dependendo de quais forem) podem te afetar, e você já tem problemas suficientes com os quais lidar. Qualquer relacionamento exige troca, apoio… É praticamente impossível não se envolver nos dilemas de alguém por quem você tem grande estima, e eu costumo ter bastante pelos meus.

É natural do ser humano ter medo de não ser amado, medo de ficar sozinho. Acredito que ninguém que inicia a formação de um vínculo imagina o seu fim, sexo casual e contatos profissionais não se enquadrariam nesse contexto de vínculo. Acredito que ninguém idealiza uma amizade problemática, com prazo de validade… Ninguém quer amigos para curtir sexta feira a noite e com os quais não se pode contar para nada além disso, nem deseja se apegar a alguém e depois ver essa pessoa ir embora, por qualquer que seja o motivo… A ideia que as relações passam é que serão sólidas e eternas, mas conforme essa inocência é perdida, elas se mostram frágeis. Isso também é natural do ser humano, e já que as coisas acontecem assim, seja no Tinder, na vida real ou virtual, não custa nada ter prudência antes de deixar alguém entrar no seu mundo.

Não sei vocês, mas eu prefiro não ter que me despedir de ninguém.
E se quem tem Tinder não tem medo, acho que deveria começar a ter…

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¹ Overthink: ato de pensar demais.

² Flashforward: é a interrupção de uma sequência cronológica narrativa, uma forma de apresentar um momento futuro.

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Complexo de Mártir

Complexo de Mártir

Meus problemas são maiores que os seus…

Certamente você conhece alguém que reforça essa ideia. O hábito de querer quantificar quem sofre mais pelo número, natureza e gravidade dos problemas é uma clara demonstração de baixa autoestima e exagerado autocentrismo. Sim, essas duas características podem coexistir na mesma personalidade. A falta de confiança e a visão negativa que alguém faz de si próprio pode muito comumente levá-lo a desejar receber atenção por pena. É a manifestação da vontade ser visto como um herói por ter resistido à tantas pancadas da vida. É o desejo de receber méritos por sua bravura, ou simplesmente adquirir o título de “mais azarado da turma”, para ter a sensação do que é ser campeão em alguma coisa – ainda que não seja em algo positivo, quando sente que está cercado por pessoas com vidas infinitamente mais tranquilas e ricas em sorte que a sua.

Realmente, existem muitas pessoas em desvantagem quando comparadas a outras de seu círculo social, e é humano que elas tentem buscar vitória em alguma coisa, mesmo que essa coisa seja o número de fracassos. Obviamente ninguém se orgulha dos próprios insucessos, mas continuar a ser uma pessoa de bem depois de ter passado por tantas provações acaba te atribuindo um tipo de triunfo por suas virtudes. Faz você parecer muito mais bravo e resistente do que de fato é, embora possua sim alguma bravura e resistência… Tem gente que pensa que tudo que já sofreu na vida pode ao menos servir para fazer com que seja visto com olhos de admiração por aqueles que o conhecem, e muitas pessoas com esse complexo buscam o título de mais sofredoras que Maria do Bairro.

Se essa pessoa conseguisse perceber, e apenas perceber, a força e capacidade que possui por ter passado por tantas situações sem desviar da retidão, essa poderia ser contada como uma de suas qualidades. Porém, para quem é assim, essa percepção se manifesta em forma de inferioridade, diminuindo o valor da força e ressaltando justamente o lado ruim, que seria a extrema falta de sorte. Pessoas assim rapidamente tentam compensar esse autodesprezo inventando uma competição; Todo mundo tem um amigo que, ao ouvir o relato de uma adversidade parece tentar ser otimista e mostrar para você o quanto a situação não é tão ruim quanto você pensa, quando, na verdade, ele usa desse artifício para compartilhar o próprio infortúnio, comparando-o ao seu e tentando diminuir a importância daquilo que você está passando.

É natural que compartilhemos nossas tristezas com os mais próximos, mas precisamos nos manter atentos para não tornar isso um vício e não transformar todas as conversas em desabafos. De pequenos maus hábitos podem nascer más personalidades. Pode ser que no seu interior você sinta que sofreu mais que outros. Desde que você não se comporte como tal e não alimente a ideia, isso não o rotula como alguém com complexo de mártir. É preciso compreender que só você sabe o quanto já sofreu. Só você sentiu, pois seus sentimentos são apenas seus. A forma como você reage ao que lhe acontece só pode ser conhecida por você mesmo. Suas dores só são importantes para você, talvez (e no máximo) para sua mãe, pai, ou alguém que sofra de verdade ao te ver sofrer e ninguém além disso.

Ainda que nos sintamos compreendidos por outra pessoa, ou que ela tenha úteis e sábias palavras de conforto para nos transmitir, não significa que sejamos de fato compreendidos. A empatia é uma característica admirável – quando é genuína, mas ela não garante que alguém sinta a mesma dor que você está sentindo ou que sequer a compreenda realmente, mas no fim isso não importa. O que importa é o ombro amigo que se recebe num momento de necessidade. Então, não cabe a você comparar e quantificar seus problemas com o de outros de sua convivência, o que cabe é saber ser amigo também, é saber ouvir, é compartilhar se quiser, mas nunca, em hipótese alguma, se tornar o tipo de pessoa que age como se o que os outros passam não fosse tão grave ou relevante quanto o que você passa.

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O Tabu do Arrependimento

O Tabu do Arrependimento

Esses dias me peguei linkando a relação entre a música Hello da Adele, o comportamento social nessa época do ano e as consequências de suas manifestações. Está chegando a temporada dos corações partidos, que popularmente atende pela alcunha de Carnaval. Logo fiz a analogia entre o evento e a canção. A letra é fácil de decorar e toca num ponto chave e clichê, que beira ser considerado um tabu, mas com o qual é fácil se relacionar desde que se tenha vivido qualquer tipo de relacionamento.

Pensei na quantidade de pessoas que vem sendo orquestradamente descartadas na última semana por seus amorzinhos, que tem em vista curtir a festa sem amarras. Amorzinhos que, de sua forma deturpada, acreditam que isso os isenta do peso na consciência diante da grande possibilidade de traição. Seguindo essa linha, também pensei em quantas dessas pessoas descartadas, que provavelmente amargarão o feriado inteiro na fossa, serão procuradas novamente na quarta feira de cinzas para retomar o relacionamento.

Por questões culturais, a tendência observada em qualquer círculo social aponta que suas dores são inconvenientes. Se você sacaneou ou foi sacaneado, não importa a distinção entre o sujeito que sofre e o que faz sofrer, não é bem visto que você exponha suas mágoas, e essa visão opressora é potencializada quando falamos de arrependimento. Se você sente qualquer um dos dois, fale com um amigo próximo – mas também não encha o saco dele, tome uma cerveja, ou 20, procure um médico, engula um remédio, coloque o seu bloco na rua, mas não deixe que ninguém veja o que há por baixo da sua pele.

Diversos cantores expuseram anteriormente essa idiossincrasia na qual sentir dor e deixar que os outros saibam é condenável, mas a questão do arrependimento foi poucas vezes abordada de forma tão intrínseca. Adele entrou no cenário com as palavras certas. A mensagem de sua canção a posiciona como a carrasca em busca do perdão. Ela fala, sem entrelinhas, do sentimento mais difícil de reconhecer em si próprio, e joga essa carta aberta para admitir contrição sobre o que fez a outrem. Ainda que sua música não esteja inserida num contexto carnavalesco, o tema abordado se relaciona diretamente ao ato de descarte vastamente difundido nessa época do ano, mas que acontece diariamente com toda sorte de pessoas.

Você tem pelo menos um amigo que está sofrendo nesse momento por outra pessoa. Garanto que pode pensar em vários quando questionado sobre “quem sofreu por atitudes alheias”, mas duvido que seja capaz de lembrar de alguém específico se tiver que apontar “quem demonstrou sentir culpa por causar sofrimento”. Se a dor comum a todos é pouco comentada, o arrependimento é dado por morto. Talvez, pensando em si mesmo, você reconheça que já causou alguns pesares, mas essa culpa pessoal dificilmente será admitida, menos ainda compartilhada.

Nesse devaneio imaginei o quão maravilhoso seria se a Adele tivesse partido todos esses corações, e o meu inclusive, em diversas ocasiões… Nenhuma música e nenhum pedido de desculpas conseguem apagar meses, e dependendo da personalidade de cada um, até anos de decepção e tristeza pela falta de respeito, pelo abandono e o que mais tenha causado do fim da relação. Ainda assim, não seria ótimo ver o carrasco assumir responsabilidade por seus atos, tendo ou não se arrependido, mas sendo minimamente íntegro ao admitir que falhou com quem dizia estimar?

Com a repressão do arrependimento, a importância das desculpas foram se perdendo. Talvez esse tabu tenha nascido do orgulho, ou da necessidade de reforçar socialmente a ideia de que você “está ocupado demais sendo feliz para ter tempo de sentir remorso”. Sem essa estupidez quase coletiva haveria mais compensação de danos, e a libertação pessoal trazida pela capacidade de se reparar com alguém seria vastamente exercida. A criação de laços saudáveis e o desenvolvimento de personalidades que, desprovidas de tantas culpas, teriam mais espaço para a paz interior seria comum a todos.

Não foi a Adele quem partiu o meu, o seu, e todos os demais corações, mas foi ela quem trouxe algum senso de culpa não admitida. Foi ela quem deu voz as desculpas que nunca foram pedidas, e que, inconscientemente, esperamos de quem nos falhou. Sua música estará para sempre na história para lembrar (a quem precise ouvir um pedido de perdão) que em algum momento alguém se responsabilizou por seus erros. Tentou se reparar pelo irreparável, mas principalmente, que tentou. E isso talvez possa trazer um pouco de conforto para aqueles que sofrem com a falta de consideração alheia.

Então minha dica para você que está nessa espera, talvez alimentando esperança de algo que pode nunca vir, é: escute Hello. Veja o clipe, coloque em loop infinito, cante aos berros, exorcize esse nó na garganta, chore, mas siga em frente, e caso esteja no time de descarte pré festa, curta o carnaval. Não deixe que os atos de alguém que foi capaz de te tratar com tanta indiferença te impeça, por um segundo sequer, de sentir alegria e aproveitar a vida.

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